3.11.07

Cérebro sonoro


Estou lendo "Alucinações musicais", de Oliver Sacks (74 anos), e confesso que cada vez gosto mais deste neurologista inglês que escreve com alma de artista. Logo na introdução do livro uma bela citação de Nietzsche:

Acompanhamos o ritmo da música involuntariamente, mesmo se não estivermos prestando atenção a ela conscientemente, e nosso rosto e postura espelham a "narrativa" da melodia e os pensamentos e sentimentos que ela provoca...


Em recente entrevista a revista Veja, Sacks revelou que descobriu um tumor no olho direito em 2005. Submeteu-se a tratamento por radiação e sessões de laser. A cura é incerta, mas, em vez de fazer do assunto um tabu, Sacks registra sua vivência da doença num diário. Num desenho do globo ocular, ele mostra a mancha que atrapalha sua visão. Para explicar como os objetos se tornam invisíveis para ele por causa dela, usa um conceito da astrofísica, os "horizontes do evento". Eles ocorreriam, segundo a teoria da relatividade de Albert Einstein, na periferia dos "buracos negros", dos quais nenhuma matéria ou radiação consegue escapar. Como saber que os "buracos negros" existem se não emitem luz ou outra radiação? Justamente pelos "horizontes do evento", turbulências detectáveis que ocorrem na fronteira do espaço-tempo e que sinalizam a existência de um "buraco negro" nas proximidades. "Como nos horizontes do evento, há experiências quase impossíveis de comunicar", diz Sacks. "Fazemos o possível com metáforas". Acho que só mesmo as metáforas para nos fazer continuar, seguir em frente e não olhar muito para trás.

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